A flexibilidade no processo de definição muscular é de suma importância!
Compreendemos todo o processo de definição muscular como a forma
de tornar aparentes os músculos da camada mais superficial do corpo,
mostrando seu “desenho” anatômico. Entendemos que para esse
acontecimento deve haver fortalecimento e desenvolvimento dos músculos
em si, além de redução da camada de gordura existente no tecido subcutâneo
– camada entre pele e músculo. Juntamente com a força e a resistência, a flexibilidade também é um componente muito importante para o bom desempenho muscular.
A flexibilidade
Falaremos aqui sobre a flexibilidade num sentido mais abrangente, incluindo não só a
concepção de mobilização e alongamentos, mas também os mecanismos mais
complexos que envolvem todo o tecido conjuntivo nas ações neuromiofasciais,
incluindo os trabalhos excêntricos e proprioceptivos.
Vale dizer que o somatório de todas essas valências – força, trabalho
excêntrico, flexibilidade, mobilidade e propriocepção – garantem um melhor
desempenho e maior controle neuromuscular, proporcionando assim um
resultado mais completo, funcional e também mais estético para o corpo.
Notamos que muitos dos exercícios do método Pilates trabalham essas
capacidades ao mesmo tempo, como podemos observar no exercício da foto 1.
Vamos entender como funciona todo esse processo?
Primeiramente é importante que entendamos um pouco mais sobre o tecido conjuntivo, um dos nossos quatro tipos celulares primários (neural, muscular, epitelial e conjuntivo) que compõe a maior parte das estruturas que iremos estudar dentro da “flexibilidade”.
As células conjuntivas são pouco eficazes na contração, porém são excelentes condutores iônicos e sua especialidade é a secreção de uma incrível variedade de produtos dentro do
espaço intercelular que se combina para formar nossos ossos, cartilagens, ligamentos, tendões e fáscias. Elas são o substrato estrutural para todas as outras, construindo o “estofo” forte e maleável que nos mantém unidos. (Thomas W. Myers, Trilhos Anatômicos).
A rede fascial conecta todos os tecidos e transmite informações através de sinais bioelétricos que espelham com precisão as informações mecânicas originais. Um movimento de tração na rede fascial é comunicado através de todo o sistema como um fio puxado em blusa de lã. Essas comunicações acontecem na maior parte do tempo fora do
nosso nível de consciência.
Notoriamente, a força e a flexibilidade são dois componentes importantes da aptidão física (PAULO et al., 2012), a questão é a interferência de uma sobre a outra, o que gera, segundo Leite e Nonaka (2009), muitas controvérsias e discussões. Assim, o mais importante é entender sobre o assunto buscando o melhor ponto de combinação para realização do trabalho com essas “duas” variáveis, alcançando bons resultados, principalmente no que se refere ao desenvolvimento muscular.
A hipertrofia
Como explicitamos na matéria sobre “fortalecimento muscular no processo de Definição”, o processo de hipertrofia compreende a adaptação ao treinamento de força, que promove o aumento na seção transversa das fibras musculares, sendo importante a execução de exercícios isolados com ações concêntricas e excêntricas, com intensidades de moderada a intensa.
Explicamos também que o fortalecimento muscular está ligado a capacidade de exercer tensão muscular contra uma resistência, envolvendo fatores mecânicos e fisiológicos que determinam a força em algum movimento particular. E que esses dois processos juntos promovem inúmeros benefícios quanto ao desenvolvimento dos músculos tornando-os delineados e tonificados. Além de outros ganhos como a melhora cardiovascular, composição corporal, aumento da força, da potência e da resistência.
Entretanto, músculos hipertrofiados e com níveis adequados de força muscular apenas não garante eficácia na execução dos diferentes movimentos envolvidos na realização das atividades da vida diária. É necessário também que o corpo desenvolva igualmente suas outras capacidades funcionais como flexibilidade, mobilidade e equilíbrio.
Estudos força x flexibilidade
Há alguns anos muitos estudos vem sendo publicados sobre essa temática, com o intuito de esclarecer a visão sobre as controvérsias que existem entre os trabalhos de força x alongamentos, pois na literatura sobre o assunto há afirmações de que o aumento do volume muscular diminui a flexibilidade em algumas articulações.
Em 2011 foi publicado um trabalho (Ferreira, 2011) que constatou que indivíduos com melhores níveis de força apresentam melhores níveis de flexibilidade e deixou claro que o treino de força melhora a flexibilidade quando os exercícios com a força é realizada com
máxima amplitude de movimento, equilibrando o trabalho com os músculos agonistas e antagonistas, incluindo também exercícios de alongamentos nos treinamentos de força.
Em contraponto, relata que o treino de força isolado prejudica a flexibilidade em consequência do aumento rápido transversal do componente contrátil. Por isso, é tão recomendada a necessidade de trabalhar e desenvolver a flexibilidade antes de um trabalho efetivo de força (hipertrofia).
Sabemos que a flexibilidade é a amplitude de movimento ao redor de uma articulação; ou ainda, é a qualidade motriz que depende da elasticidade muscular (ventre muscular e tecidos conjuntivos que também o compõe) e da mobilidade articular expressa pela máxima amplitude de movimento necessária para execução de qualquer movimento sem causar nenhum tipo de lesão.
Segundo Magnusson (1996) e Gonçalves et al. (2008), para obter e manter maiores níveis de flexibilidade é necessário o emprego de estímulos sistematizados e específicos denominados alongamentos, que são exercícios que promovem o aumento da extensibilidade de músculos, fáscias, tendões e ligamentos, e podem ser realizados de formas distintas: estático, passivo, dinâmicos ou ativos. Faz-se também necessário a aplicação de movimentos e exercícios que visam trabalhar a mobilização articular e o equilíbrio.
Benefícios do alongamento
Dos muitos benefícios trazidos dos trabalhos de alongamento, podemos ressaltar a ativação da circulação, redução do risco de entrose ou lesão, relaxamento muscular, melhora da força e da resistência, o aprimoramento da coordenação motora, pois os movimentos tornam-se mais soltos e fáceis; favorecendo outras atividades e esportes como: corrida, dança, tênis, natação, ciclismo, halterofilismo e outros. Na medida em que prepara o corpo para a atividade, os alongamentos dinâmicos sinalizam para os músculos que estão prestes a serem utilizados.
Além disso, o trabalho de alongamento/ flexibilidade, desenvolve a consciência corporal, melhorando a postura, e conforme alongamos as várias partes do nosso corpo, você as
focaliza e entra em contato com as mesmas aprendendo a conhecer-se. Ajuda a liberar os movimentos bloqueados por tensões emocionais, de modo que isto aconteça de forma espontânea. Reduz as tensões articulares provocadas por músculos muito encurtados, que na maioria das vezes são responsáveis por problemas articulares (principalmente em idosos ou em indivíduos que se viciam em posições erradas do dia a dia).
Gera aumento da eficiência mecânica, por permitir a realização de gestos e movimentos que, sem esta prática, seriam simplesmente impossíveis. Propicia condições para melhoria da agilidade, força e velocidade, reduzindo a deteorização física associada com a idade.
Reduz a resistência tensiva muscular antagonista e aproveita mais economicamente a força dos músculos agonistas. Restaura a amplitude de movimento normal na articulação envolvida e a mobilidade das partes moles adjacentes a esta articulação.
Como trabalhar a flexibilidade e outros pontos importantes
O ideal é que a flexibilidade seja trabalhada em sessões especiais para tal finalidade, com técnicas mais especificas visando melhorar a elasticidade e plasticidade muscular, tendínea e ligamentar. Ela também pode ser combinada adequadamente junto ao treino de força, porém, segundo os mesmos estudos citados, esses alongamentos não devem ser feitos na técnica estática antes ou durante o treino de força, pois comprovadamente dessa forma pioram o desempenho muscular. Mas trabalhá-la através de exercícios de mobilização
ou alongamento dinâmico antes do treino de força pode melhorar o rendimento.
Mobilidade
A mobilidade é tecnicamente a capacidade do corpo em executar movimentos de pequena, media e grande amplitude, livre de bloqueios ou restrições no que diz respeito as articulações. É o grau de realização do movimento dentro de uma liberdade natural de amplitude e pode ser trabalhada através de movimentos dinâmicos realizados com as articulações e deve ser priorizada antes das atividades físicas de força.
Propriocepção
Os exercícios de propriocepção também são importantes, não só para melhorar o equilíbrio e os movimentos precisos, mas também para ensinar ao corpo como se movimentar de forma segura e protegida dentro daquilo que é funcional e efetivo a cada corpo.
Eles podem ser feitos de muitas maneiras, inclusive lúdicas, variando acessórios e combinações de movimentos mais complexos de acordo com o objetivo e a criatividade do instrutor, de forma a desenvolver ou melhorar a capacidade que o próprio indivíduo tem de avaliar em que posição se encontra, a fim de manter o perfeito equilíbrio do corpo
parado, em movimento ou ao realizar algum esforço.
Exercícios Excêntricos
Os exercícios excêntricos são aqueles que acontecem no sentido oposto ao movimento que os músculos fazem quando em ação concêntrica. Eles funcionam como um freio, controlando o movimento oposto ao seu. Dessa forma, o exercício excêntrico utiliza todo o tecido conjuntivo – as estruturas não-contráteis do músculo – para realizar o controle desse afastamento. É uma forma de conectar toda rede fascial envolvida na anatomia e biomecânica do movimento. Uma maneira interessante de executar essa concepção é realizar a fase concêntrica mais rápida – em 3 segundos por exemplo, e a fase excêntrica
mais lenta – 6 segundos.
Já está cientificamente demonstrado que o músculo tem uma maior atividade durante os alongamentos excêntricos e, por essa razão, é provocado um processo de reparação, regeneração e adaptação em lesões músculo-tendíneas, como também, em distensões musculares, contraturas, roturas de ligamentos, tendinites, etc, pois trata-se de uma rede miofascial que fornece um trabalho em cadeia contínuo de restrição de tensão, ajustável, em torno dos ossos e cartilagens.
Segundo um artigo publicado na revista “American Journal of Sport Medicine 2011”, aproximadamente 66% das lesões nos músculos isquiotibiais poderiam ser prevenidas se houvesse utilização da força excêntrica. E aproximadamente 90% das lesões desportivas devem-se a gestos excêntricos, por falta de flexibilidade e readaptação do atleta ou desportista.
Exercícios x técnicas
Existe uma variedade imensa de exercícios e técnicas para trabalharmos todas essas capacidades funcionais: a mobilidade articular, a flexibilidade e a propriocepção, seja através de alongamentos, mobilizações e treino de equilíbrio, treinos excêntricos, ou mesmo exercícios mais elaborados que envolvem duas ou mais valências dessas como muitos que existem dentro do Pilates principalmente.
Além da vasta e ininterrupta comunicação que existe na rede fascial, outras transmissões de informações especificas também podem se dar através do sistema neural por meio de receptores próprios de alongamento, como os órgãos tendinosos de Golgi e fusos musculares, mecanismo que atua em conjunto balizando o alongamento e que consiste em receptores intra-musculares sensíveis às alterações no comprimento das fibras musculares, na velocidade e na tensão dos movimentos feitos pelos músculos, respectivamente. Há também os receptores articulares (bulbos terminais de Krause, corpúsculo de Paccini e órgãos terminais de Ruffini) que transmitem informações sobre ângulo articular, aceleração das articulações e grau de deformação causado pela depressão.
Quando esses proprioceptores são estimulados no estiramento a cada repetição do movimento, esses receptores provocam respostas reflexas (reflexo miotático) que, por sua vez, induzem adaptações que são benéficas para o ganho da mobilidade articular e
elasticidade muscular. (DANTAS, 2005; WALKER, 2009).
Os alongamentos e os exercícios de equilíbrio e propriocepção podem ser utilizados em muitos tipos de exercícios físicos e esportes para preparar a musculatura como um todo (tanto as estruturas contrateis – fibras musculares – quanto as estruturas não contrateis conjuntivas) para a atividade proposta. E por isso o Pilates é um exercício físico muito indicado pra quem está em busca de um corpo mais alongado e mais forte. Pois dentre muitos dos benefícios já comprovados cientificamente, o aumento da flexibilidade também é um deles.
O trabalho de flexibilidade melhora o desempenho físico, reduz o risco de lesões e as dores musculares, promove melhora significativa da postura, aumenta o fluxo sanguíneo e conseqüentemente melhora nutrição muscular e também a coordenação motora.
Dessa forma, fica claro que um treinamento voltado para a DEFINIÇÃO muscular, inclui o trabalho de força visando à hipertrofia, mas não se limita a isso, pois ele deve ser complementado também pela flexibilidade e propriocepção, desde que os exercícios sejam realizados de forma equilibrada por todo o corpo: entre músculos agonistas e antagonistas, membros superiores e inferiores, e também, com a amplitude de movimento adequada.
Desenvolver a flexibilidade permite a execução de movimentos de grande amplitude, potencializando as ações para o desenvolvimento e crescimento muscular. Esse conhecimento proporciona um adicional importante para as ações práticas pertinentes por parte dos profissionais do movimento que atuam com o método Pilates, para que o treinamento seja realizado com abrangência e qualidade para que os resultados sejam alcançados de forma efetiva.
Rafaela Palmieri
@rafapalmieri.pilates
Fisioterapeuta
Pilates internacional e avançado
Proprietária do @attivita_saudeintegrada